No mundo do desenvolvimento de software, grande parte do resultado desse desenvolvimento será depois utilizado por pessoas. Seja navegando num website, construindo gráficos numa folha de cálculo, criando o design de outros objetos, controlando a velocidade do nosso carro no painel de bordo do mesmo ou a rota que o avião onde vamos deve seguir.
O processo de design e desenvolvimento desses softwares e o seu impacto é muito interessante e recomendo a quem queira explorar este tema que leia o livro Design of Everyday Things de Don Norman (embora mais centrado no design industrial e de produto).
No entanto antes de se iniciar esse processo de design e desenvolvimento é necessário perceber o que o nosso público-alvo pretende e valoriza. Seja para definir a primeira versão de um produto, seja para validar a implementação dessa primeira versão ou descobrir o caminho a seguir para as versões seguintes.
Esta é a fase da pesquisa com utilizadores (user research), que tipicamente inclui entrevistas cara-a-cara com pessoas que representam esse público-alvo.
Na Samsys, tipicamente não temos a oportunidade de fazer este tipo de trabalho, da forma como outras empresas noutros países fazem, com equipas de etnógrafos ou outros investigadores que preparam o seu plano de entrevistas, “recrutam” os utilizadores a entrevistar, gravam as entrevistas, eventualmente transcrevem-nas e depois apresentam um relatório com o resultado da sua investigação.
Isto porque habitualmente os clientes chegam já com uma ideia muito precisa do que pretendem, ou então trata-se de um projeto muito pequeno, onde este tipo de investimento não se justifica.
Claro que isso não nos impede de, a partir daquilo que o nosso cliente nos diz, nós acrescentarmos mais informação baseada na nossa experiência ou, no limite, sugerir mesmo a realização de uma projeto em duas fases em que a primeira seja este trabalho mais exploratório (algo que atualmente estamos a experimentar na Samsys).
Ainda assim, e apesar de não me conseguir relacionar diretamente com as diferentes histórias apresentadas no livro Doorbells, Danger, and Dead Batteries: User Research War Stories, de Steve Portigal (porque não fazemos user research) não deixei de encontrar muitos pontos de contacto entre o nosso trabalho e o que é descrito no livro. Seja em reuniões de âmbito técnico-comercial, seja em reuniões de levantamento de requisitos ou de acompanhamento de projetos.
O que, se pensarmos bem, não deveria ser uma surpresa, porque na verdade estamos a falar de como pode decorrer a interação entre duas partes (entrevistador / entrevistado; utilizador / equipa de investigação; potencial cliente / comercial; cliente / programador).
Estas histórias são muito interessantes porque conseguem-nos ajudar a criar uma ideia mental de como este processo pode correr, nomeadamente todas as variantes em que ele pode correr mal, ou como poderia vir a ter um final complicado mas aquela intervenção milagrosa conseguiu dar a volta à coisa.
E há tantas variantes possíveis que seria praticamente impossível criar uma checklist que nos permitisse garantir que todas as situações foram acauteladas.
O que não quer dizer que não faça sentido ter essa checklist com aquela entrada cléssica que é “garantir que estamos a gravar” ou aquele conhecimento de saber que temos que tratar de nós (comida e casa de banho) antes se começar uma reunião.
Os casos apresentados exploram diferentes temas como a forma como mesmos os melhores planos falham, os diferentes desafios que os nossos entrevistados nos colocam, até mesmo situações de perigo físico e como a forma como lidamos com pode ajudar a descobrir “insights” que outra forma não teríamos.
Algumas das coisas que talvez possamos sistematizar, para além daquelas questões mais operacionais que referi acima, serão talvez o saber que é importante um plano mas que depois também é importante conseguir ajustar em função da realidade em que nos encontramos (local ou cultura), e a importância da ligação humana, da empatia (e não consigo deixar de fazer a ligação com a formação com o Alexandre Monteiro sobre linguagem não-verbal).
Mesmo quando falamos de projetos digitais voltamos sempre ao relacionamento humano.
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